quinta-feira, outubro 05, 2006

"Então mas isto não tem intervalo?..."

11 da noite... de uma noite que teria tudo para ser como todas as outras noites banais aqui no bairro, não fosse o facto de a escassos 100 metros de minha casa, estar acontecer O acontecimento do momento em Portugal - o assalto á dependência do Espírito Santo do Bairro do Liceu, em Setúbal.

Chego nesse momento a casa e deparo-me com algo nunca antes visto... um trânsito só igualavel em hora de ponta... carros por tudo quanto é sítio, para a frente e para trás, tudo por causa do corte da avenida onde tudo se está a passar. Resultado: tenho o tráfego de uma das mais movimentadas avenidas de Setúbal a passar-me á porta de casa. Lugar para estacionar, é mentira. Está tudo ocupado pelos mirones, que vieram de toda a cidade apreciar a cena. Estacionamentos em segunda e terceira fila... Carros em cima do passeio... Carros em cima das árvores... Um stress! Depois de muito procurar, lá encontrei um lugar numa praceta refundida e pouco iluminada, aqui nas traseiras.

Pego nas minhas coisas, deixo o carro estacionado no buraco escuro (pensando: "Hummm, esperemos que ainda estejas inteiro amanhã") e dirijo-me a casa. Por mim passam casais, jovens, famílias, homens, mulheres... todos em direcção ao local da acção. Assim como quem vai passear até ao café numa noite de Verão. Imagino a cena: "Ah, vamos ali beber uma bica e já agora vamos ver que tal tá a coisa!".

Não resisto. Pego na minha curiosidade jornalística e vou até lá. À medida que me aproximo, vou reparando nas faces e nas conversas das pessoas com quem me cruzo. As faces, eram absolutamente banais... como se tivessem saído do cinema, depois de terem visto um filme do Manoel de Oliveira, do qual não perceberam (ou não gostaram) do argumento. Agoras as conversas!... Nem sei o que vos diga! Umas autênticas pérolas... "Ainda hoje à tarde estive aqui e a polícia já nessa altura não nos dizia nada"... Pois não minha senhora, já pensou que os polícias estão aí para manter a ordem e não para servirem de 118? "Pensei que aqui se visse alguma coisa, mas afinal não se vê nada"... vê amigo, mais valia ter ficado em casa a ver a novela. "Se isto começa a demorar muito, vão ter que entrar por aí aos tiros"... Tiros, minha senhora??? "É pá, já viste tar ali dentro fechado aquele tempo todo. Será que podem ir à casa de banho?" Sem comentários...

Aproximo-me mais da coisa e junto-me ao povo que estacionou debaixo da varanda do primeiro andar, onde as 3 estações de televisão montaram o aparato tecnológico. "Ali deve-se ver bem, tá lá tanta gente", pensei. Pois, enganei-me! Não se vê nada... rien, nothing, népia, nicles! Chego á conclusão que aquela malta toda se juntou para ver... 3 carros de polícia estacionados numa avenida, e uns quantos polícias espalhados por ali... esperam, em vão, que algo mais animado aconteça, não sei bem o quê! Se calhar, que o homem desate aos tiros ou que faça explodir o prédio. Mas conversam animadamente... afinal, amanhã até é feriado, a malta pode dormir até mais tarde, e na TV não passam coisas tão emocionantes.

A páginas tantas, há um iluminado, que se sai com a frase que, para mim, recebe o prémio da noite: "Então mas isto não têm um intervalo? É que já me começam a doer as pernas!..." Lindo!Solto uma gargalhada, volto costas e vou para casa.

Decididamente, cada vez compreendo menos as pessoas.

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